terça-feira, 13 de abril de 2010

Piratininga – Parte 1



Estávamos no inicio da década de 90 e os negócios iam muito bem. Tínhamos o comércio e a pecuária, onde engordávamos fêmeas. Comprávamos vacas velhas e novilhas, só fêmeas, que no pantanal era praticamente um subproduto do boi, engordávamos e vendíamos com uma margem de lucro que dá saudades. Vaca magra tinha o preço tabelado: 7 arrobas. De 4 a 6 meses depois vendíamos por uma média de 13 arrobas. Isso só com vermífugo e pasto. As novilhas de 1 ano comprávamos por 3.5 arrobas ficavam um ano no pasto e saíam com 10 arrobas e as de 2 anos entravam por 5 arrobas e com 6 meses saíam com 10, 11 arrobas. Não tinha negócio melhor no mundo. Íamos nos leilões de Santa Clara e Novo Horizonte e comprávamos todas as fêmeas. Única condição é que chegasse viva na fazenda. Aprendemos a fazer qualquer coisa engordar. Na chegada verificávamos os dentes das vacas velhas. Se tivesse dente mole ou com falha arrancava tudo e formavam um lote das MV - muito velhas. Vermifugadas, comiam ponta de capim, e iam na frente com as vacas novas atrás. O grupo das novilhas era separado das vacas pois tinham um regime de pastego e ruminação diferentes. Eu sabia que o negócio como um todo era bom demais para durar para sempre. Já começavam a aparecer compradores de fora e o preço já começava a subir. Sempre gostei do pantanal, mas até aquela data só tínhamos fazenda de pasto plantado. Rancho Alegre, Campo Salma, Angico e Campo Novo, adquiridos nessa ordem. Engordávamos 5000 fêmeas, vivíamos do comércio praticamente, e reinvestíamos tudo que ganhávamos na pecuária nela mesmo.


Certo dia, um grande amigo de meu pai, João Vitor, me liga. Na conversa nos lembramos de um carnaval... O esquenta estava sendo na nossa casa e ele de fogo queria fazer eu cheirar lança perfume! Como eu tinha no máximo 10 anos, achei que corria mais do que ele e na fuga bati um portão achando que ele estava longe. Acabei por atingi-lo. Quando vi aquela sangueira toda, achei que tinha matado o homem. Depois das recordações de 40 anos atrás ele me informou que queria vender sua Piratininga e me pedia que não desse resposta antes de visitá-la. Precisava vender e não queria entregar a qualquer um. Resolvi ir até lá muito mais com a intenção de atender a um velho amigo do que realmente comprar uma fazenda no Paiaguás. Minha ideia era Nhecolândia que tinha um acesso melhor. Mas o João Vitor era um bom vendedor. Andamos a fazenda toda numa toyota bandeirantes velha, e quando o sol estava se pondo, ele fazendo uma volta de 180 graus parou o carro e me disse:
- Olhe isso. Você não está comprando uma fazenda. Você está comprando um pedaço do paraíso.
Quando olhei para frente, vi a vazante da formosa com o sol se pondo e aquele céu vermelho, um revoar de pássaros procurando onde dormir, aquela água espelhada com aquela pastaria verde em volta. Realmente era um pedaço do paraíso e naquele momento eu resolvi comprar. Precisava convencer meu irmão que era um pé que colocaríamos lá e devagarzinho iríamos aumentando conforme as oportunidades fossem aparecendo. Fechamos negócio uma semana depois e compramos os primeiros 8000 hectares no centro do pantanal do Paiaguás.


Fui várias vezes com o João Vitor para receber a fazenda. Tinha que fazer todo o inventário, pois o preço de compra era fechado em terras e instalações. A parte de maquinários, muares, algumas máquinas e utensílios foram pagos a parte. Foram dias de muitas reflexões, pois sabia que era a vida, não só dele que estava ali, mas de seus ascendentes também. São dias que relembro com alguma tristeza e tenho um carinho todo especial com a Piratininga, também por causa do meu amigo João Vitor.
Continua.

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